O Dia em Que Eu Morri para o Mundo
- Antonio Jorge Béze
- 13 de abr.
- 3 min de leitura
Um conto sobre aqueles que, no fundo, sempre souberam que havia algo mais…
Acordei sem vontade de levantar.
O despertador tocou às 6h20, como todos os dias, mas nem o barulho insistente conseguia me arrancar do torpor. O mundo lá fora parecia cinza — não pelo clima, mas pela alma. E por dentro, tudo era ainda mais nublado.
Fui até o banheiro em passos arrastados. O rosto no espelho já não me dizia nada. A barba por fazer, os olhos fundos, as olheiras que contavam mais sobre a minha vida do que qualquer conversa superficial de café. O cansaço não era físico. Era existencial.
Por que continuo fazendo tudo isso?
Pra quem?
Pra quê?
Quantas vezes me peguei desejando que algo me parasse. Um acidente, uma doença, qualquer coisa que me desse o direito de pausar. Eu só não esperava que isso fosse acontecer… naquele exato instante.
Foi como um tiro seco no peito. Uma dor lancinante. A respiração travou. As pernas falharam. Tudo girou, e eu caí ali mesmo — entre o tapete do banheiro e a pia fria que sempre detestei.
Imagens começaram a surgir como um filme cruel:
A risada do meu filho me chamando pra brincar — e eu dizendo que estava cansado.
Os olhos da minha esposa me procurando durante o jantar — e eu distraído com as notificações do celular.
Meus pais. Meus amigos. O culto que eu recusei. As vezes que senti vontade de orar, mas não tive coragem de parecer fraco.
E então… o escuro.
Mas não foi um escuro qualquer. Foi um tipo de vazio que nenhuma palavra é capaz de descrever. Não havia som, não havia forma… apenas uma consciência dolorosa de que eu desperdicei tudo.
E foi ali, entre a vida e a morte, que eu O senti.
Não com os olhos, não com os ouvidos — mas com o coração. Aquele que eu ignorei, que deixei de lado enquanto corria atrás de tudo o que agora já não valia nada… Ele estava lá. Não com dedo em riste, mas com um olhar que dizia:
“Você não foi criado para isso.”
Foi então que, com um susto, voltei.
Abri os olhos suando, arfando, como quem renasce.
Minha esposa dormia ao lado. A mesma luz cinza filtrava-se pela janela.
Mas tudo, tudo estava diferente.
Corri como quem sabe o que precisa fazer. Vasculhei a estante até encontrar o que um dia me guiou e que agora estava coberto de poeira: a Bíblia. Ela caiu no chão, e se abriu em Ezequiel 37 — o vale dos ossos secos.
“Assim diz o Senhor Deus a estes ossos: Eis que farei entrar em vós o
espírito, e vivereis.”
(Ezequiel 37:5)
Sentei no chão com ela entre as mãos e chorei. Chorei como um filho que volta pra casa. Como quem sabe que morreu por dentro e recebeu uma nova chance.
Naquela manhã, ninguém mais acordou na minha casa. Mas eu acordei.
Acordei do sono da alma. Acordei pra eternidade.
Acordei pra valorizar os pequenos gestos, os momentos que eu troquei por metas vazias, por aplausos que nunca me preencheram.
Hoje, antes de qualquer coisa, eu oro.
Antes do celular, antes do café, antes do mundo — eu ajoelho.
E se você está lendo isso, talvez esse seja o seu chamado também.
Porque nem todos precisam morrer para acordar.
Mas todos precisam decidir viver… de verdade.
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